quinta-feira, 29 de março de 2007

"Efeito Borboleta"


Em mais uma dessas noites – cair de tardes, para ser mais precisa – numa dessas no meio de um mar de pensamentos embaralhados na minha cabecinha, só o brilho da lua nova parecia iluminar um céu quase sem estrelas. A vista da minha sacada me revelava milhares de luzes nas casas que pareciam estar aos meus pés, cercando uns poucos prédios esparsos no meio daquele oceano de casas. Minha cabeça só queria um pouco de descanso e ar puro, e com aquela vista e uma boa música ao fundo, até que não foi difícil (pelo menos quanto à sensação de ar puro...). Ao olhar para aquela vista que mais parecia um cartão postal, tudo parecia estar em perfeita harmonia: os cães latindo bem ao longe, carros deslizando ordenadamente sobre as ruas e o silêncio dos moradores como se estivessem reunidos com suas famílias na mesa de jantar ou em frente à TV (assistindo o nosso retumbante Jornal Nacional, como não poderia deixar de ser)...

Apesar da tranqüilidade ao meu redor, por quê meus pensamentos não podiam (e parecem não poder mesmo) se ordenar tão harmonicamente da mesma forma? Por quê o pensar no futuro é tão inquietante? (Tiro os meus chinelos e o vento roça suavemente os meus cabelos. Um casal sobe a rua de baixo. O CD já deve estar em uma de suas últimas músicas e a luz da casa do meu vizinho se acende. Uma buzina corta a harmonia por um momento. Mas só por um momento...) Por quê minha vida não podia ser só aquela, imaginando que o caos não existe e que as pessoas não brigam? Mas eu simplesmente não podia. Meu coração inquieto dentro de mim não parava de se lembrar das doses cavalares de informação que recebe todos os dias, das fotos das pessoas mortas no Iraque ou da entrevista do presidente no rádio hoje. Então, eu começava a me sentir tão impotente e tão indefesa diante disso tudo. Tudo o que eu queria fazer era me concentrar na paisagem e arejar a cabeça repelindo a vespas que voavam ao redor da minha ilustre cognição pseudo-científica (e enquanto isso, mais dois ou três carros descem a rua de baixo e um cachorro late estridentemente no outro quarteirão...).

Aí eu fiquei a me perguntar: que mundo é esse que deixaram para a gente e o que podemos fazer com ele? Ou melhor, o que VAMOS fazer com ele? Como era de se esperar, eu não tenho a resposta para tais perguntas (um telefonema interrompe as minhas perguntas), mas na verdade todo mundo já sabe a resposta e ninguém liga mesmo. Mas, para tentar aliviar e acalmar as dúvidas, nada como uma dose de pensamento positivo, auto-confiante em seu mais brando senso comum: “se conseguir me mudar a mim mesma, é certo que as coisas ao meu redor também irão mudar”. Não sou muito de acreditar em correntes de Internet, mas uma frase de alguma delas ficou gravada em minha mente: “o que você faz e como age no seu dia afeta pelo menos dez pessoas...”. Bom, se são dez ou se são cem, na verdade não me lembro direito. O fato é que sempre afetamos e inspiramos a alguém (minha irmã agora me pára e pergunta umas coisas sobre a minha mãe e mais dois carros sobem a rua de baixo, numa velocidade um pouquinho acima do usual). E se o que fazemos afeta as pessoas ao nosso redor, podemos afetar muito mais gente do que imaginamos... Isso me lembra até daquela teoria de que se uma gota d’água cai no oceano, mexe com toda a estrutura dele. Bom, quem sabe isso também funcione com as pessoas?

Talvez... Alguém aí do outro lado assistiu Babel? Qual é a moral da história bolada por Iñarritu que não seja essa? “o bater de asas duma borboleta na China pode causar um Katrina no Rio de Janeiro”... bom, eu queria estar na China pra matar essa borboleta então. Mas no fundo, no fundo, essa teoria-que-soa-pseudo-científica deve ter mesmo um pouco de verdade. Afinal (só pra citar um caso mais extremo), depois que o Zé Ninguém do Mark David Chapman matou o John Lennon, em 1980, o mundo nuca mais foi o mesmo. E foi uma balinha só, ele poderia até ter errado o alvo. Um exemplo mais prático: depois de anos e anos tratando o planeta como uma lata de lixo, as pessoas finalmente perceberam que o cataclismO está perto. É, e quem vai pagar o pato são pessoas como eu e você, que me lê agora, daqui a não muito tempo (e nisso a noite cai e os carros param de passar. Talvez tenham me ouvido pensar e ficaram com medo de sair de casa pra não poluir mais a rua de baixo), infelizmente.

E enquanto isso tem gente achando que basta ser idiota como o George Bush Filho (a.k.a. Charles Manson, que, convenhamos, era literalmente filho de uma puta) para gerar um impacto negativo enorme na sociedade... cheguei à conclusão de que não necessariamente é preciso ser tão estúpido para fazer ações tão escabrosas. Ele só fez isso porque era presidente. Mas se o ilustríssimo tivesse o revólver do Mark David Chapman na mão, mataria o Lennon também (Iñarritu para presidente ianque!). Com isso, caras como o ilustríssimo aí nem precisam da teoria da borboleta para gerar um impacto. Mas para nós, que somos pessoas normais, talvez ela funcione e seria legal se prestássemos atenção nisso mais vezes.


Quanto aos carros na rua de baixo, parece que não há mais nenhum. Deve ser o medo de causar uma chuva ácida no Camboja.

Pra começar

É, finalmente me rendi aos encantos da tal blogosfera. Incrível como a gente tem reservas com coisas tão bobinhas. Ou não.